domingo, 15 de agosto de 2010

Do parasitismo à simbiose

Atualmente, há grande facilidade para compreender as relações ecológicas e as formas de interações biológicas no mundo natural, por meio do cinema, da televisão, das novas tecnologias da informação. Assim, por exemplo, os programas na National Geographic ou a série Planeta Terra, da BBC, mostram tais interações nos pólos, nas montanhas, na água doce, nas cavernas, nos desertos, nas grandes planícies, nas selvas, nas florestas sazonais, no mar raso, nos grandes oceanos.

Os tipos de relações variam das de parceria e cooperação às de antagonismo ou competição. A simbiose e o comensalismo são relações harmônicas; são desarmônicas as interações como a antibiose (princípio usado nos antibióticos, que matam ou inibem certos organismos vivos), o predatismo, o canibalismo, o parasitismo. Relações antagônicas aplicam estratégias astuciosas, de predação e mortes violentas.

O Homo sapiens mantém vários modos de relações ecológicas e interações com os demais de sua espécie, com outras espécies e com o planeta que o hospeda.

O ambientalista José Lutzenberger dizia que a população humana vem se comportando pior do que o pulgão no tomateiro. Ele se referia ao parasitismo, um dos tipos de relações desarmônicas que ocorre no mundo da natureza. O parasita vive no corpo do hospedeiro, do qual retira alimentos. O pulgão se reproduz até matar a planta hospedeira. O Homo sapiens parasita é inquilino de seu habitat Terra, nutre-se dele. Hóspede voraz, consome sem limites alimentos, matérias primas e energia e caminha para cometer o matricídio da mãe-terra que o nutre. Mas a natureza pode assumir a face da mãe Kali, a deusa hindu, que representa a natureza. Deusa da morte e da sexualidade, é a divina Mãe do universo e destrói a maldade. Com desastres mais intensos e freqüentes, a natureza mostra sua força diante daqueles que a parasitam. Numa reedição da expulsão do paraíso, nossa espécie corre o risco ser expulsa do planeta que a hospeda, conforme sugere James Lovelock, o autor da teoria Gaia, que estima que estaremos reduzidos a um bilhão de pessoas até o final do século XXI.

Sendo animal e sendo político, para o ser humano formas de interações correspondentes às biológicas e ecológicas se reproduzem no campo das relações políticas, sociais, econômicas, afetivas. No campo social e político, as relações negativas podem ser de guerra, de confronto e de conflito violento ou não violento, de dominação, de submissão, de dependência, de manipulação; na interação positiva ou harmônica ressaltam as relações de diálogo, de cooperação e parceria, de enriquecimento mútuo, de aliança.

A consciência e a ação ecológica podem fazer-nos caminhar rumo a uma evolução conscientemente projetada e construída. Nela, os seres humanos vivem relacionamento mutuamente reforçador com a comunidade maior dos sistemas vivos e tem atitude colaborativa com a natureza, conforme a visão da “sustentabilidade recíproca”: o ser humano sustenta a natureza e, por sua vez, o mundo natural sustenta o ser humano.

Simbiose implica cooperação, convivência, coevolução do ser em seu ambiente, e reciprocidade mutuamente reforçadora. A simbiose é uma relação entre duas plantas, uma planta e um animal, ou dois animais, na qual ambos os organismos recebem benefícios. Na relação simbiótica, os organismos atuam em conjunto para proveito mútuo. Aplicado na ecologia industrial, o conceito supõe que existam interações lucrativas entre empresas de vários setores, pelas quais recursos tais como a água, a energia e materiais provenientes de uma indústria são recuperados, reprocessados e reutilizados por outras. Na ecologia urbana, o conceito de symbiocity, desenvolvido na Suécia, promove o desenvolvimento urbano holístico e sustentável, encontrando sinergias entre funções urbanas e tornando-as eficientes e lucrativas.

O simbionte nutre o hospedeiro de quem depende para sobreviver.

Nos processos evolutivos em curso no planeta, há forças exógenas, cósmicas, algumas compreendidas pela nossa espécie e outras ainda não compreendidas. Podemos atuar sobre algumas e redirecionar tendências, alterando a intensidade das forças, reduzindo a força das relações desarmônicas de antibiose, predatismo, canibalismo, parasitismo, escravagismo, competição. A probabilidade de construirmos uma Era Ecológica aumenta ao se promoverem relações harmônicas do ser humano em seu habitat: relações de simbiose, mutualismo, comensalismo.

Postura ética e política diante da crise ecológica exige a aplicação de valores tais como o da harmonia e da não violência. A ética política busca a liberdade e o bem viver para todos ao evitar a guerra, a violência, as relações indesejáveis, negativas, antagônicas e desarmônicas como a predação, o parasitismo e a defesa de privilégios, o escravagismo, as dominações social e politicamente injustas.

Isso implica fortalecer modos de relação harmônicos com o ambiente que nos nutre e com as demais espécies, bem como relações harmônicas intra-específicas (sociais, políticas, econômicas) e dissolver ou reduzir a importância de relações desarmônicas ou antagônicas.

Implica evolução do parasitismo à simbiose.

Maurício Andrés Ribeiro - Autor de Ecologizar e de Tesouros da Índia para a civilização sustentável - www.ecologizar.com.br / mandrib@uol.com.br

Disponível em:
http://www.portaldomeioambiente.org.br/coluna-mauricio-andres-ribeiro/5065-do-parasitismo-a-simbiose.html


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