'As melhores coisas do mundo', novo filme de Laís Bodanzky, fala ao aluno, mas também ao professor. Quem não quer conhecer aquele para quem se está ensinando?
Por: Thiago Camelo
Um marco no 'cinema adolescente' nacional. É o que muitos falam sobre o novo filme da diretora Laís Bodanzky: As melhores coisas do mundo. A crítica acabou se rendendo à obra, lançada em todas as capitais do país, com exceção de Recife, no dia 29 de abril – a maioria julga que é o primeiro longa-metragem brasileiro que conseguiu, de fato, retratar o que acontece realmente nas escolas brasileiras.
Claro que há um recorte. Afinal, nem todas as escolas brasileiras são iguais à de Mano, protagonista do filme: um colégio particular paulistano.
Assista abaixo ao trailer de As melhores coisas do mundo
A história gira em torno do garoto (Francisco Miguez), adolescente de 15 anos. Ele também a narra. A voz de Mano nos guia tanto quanto o seu olhar. Ingênuo até, mas não submisso. Ele sabe se defender e atacar, quando precisa.
O seu colégio é muito parecido com as escolas de todos que estudaram em típicas instituições de classe média. Há grupos dos mais variados, mas todos ambientados em um universo de conforto econômico comum – por mais diverso que este universo possa ser.
Assim, questões como o bullying virtual, os blogues, as máquinas fotográficas, os celulares, as mensagens de texto e as redes sociais estão dentro do filme. Em entrevista à revista Época, a diretora Laís Bodanzky afirma que "a maioria dos adolescentes não é porra-louca". Provavelmente por isso, ela não os retratou como tal.
Ali não tem bobo, mas também não tem diabo. Uma pluralidade mais honesta do que se costuma ver nos filmes adolescentes, sejam os nacionais, sejam os estrangeiros.
Tudo rápido demais
Acaba incomodando a velocidade com que os diálogos passam na tela. Tudo meio veloz, meio recortado demais. Também existe uma necessidade de abarcar todos os personagens possíveis em uma escola: o bonito, o feio, a chata, o nerd, o gente boa, a lésbica, o emo, o professor de física legal, o professor de física chato etc. Pouco tempo para muitos personagens.
- A turma toda reunida. Do 'nerd' ao mais popular, uma coleção de arquétipos (foto: Divulgação / Beatriz Levèvre).
Mas os centrais, Mano, seu irmão mais velho Pedro (Fiuk) e a turma que gira ao redor deles ganham mais atenção. Os dilemas acontecem.
Mano, por exemplo, é virgem. Gosta da menina fútil da escola. E isso é uma grande questão. Pedro é triste, tem um blogue em que conta suas mágoas com o mundo e consigo mesmo. Os dois são amigos, mas também são irmãos. Irmãos têm conflitos, como Mano e Pedro.
Pesquisa antes de filmar
Antes de filmar, Laís Bodanzky montou um grupo de pesquisa com estudantes de verdade e os perguntou sobre tudo. Desse processo saíram parte do roteiro e o direcionamento do filme.
É curioso pensar que as questões da obra aparecem mesmo aos nossos olhos todo o tempo. Adolescentes e a internet. Quanto já não debatemos sobre isso?
Este ano, o jovem diretor Esmir Filho fez Os famosos e os duendes da morte. Filme sobre adolescentes também. Bem diferente estética e narrativamente do filme de Laís Bodanzky. No entanto, guarda igual interesse sobre o uso de internet e tecnologia pelos jovens. A própria casa e a escola se confundem, uma vez que ambas podem ser acessadas por um mesmo lugar – o computador.
O computador, nos dois filmes, é também perigoso. No caso de As melhores coisas do mundo, ele serve como escape às avessas para Pedro afogar-se em suas próprias angústias. Até tentar o suicídio. No longa-metragem de Esmir, há uma conversa via MSN que sugere um amigo virtual incentivando que o personagem principal se suicide. Caso que aconteceu, na vida real, com o jovem músico brasileiro Vinícius, que com 16 anos tirou a própria vida após conversas virtuais.
Por que o professor deve ver o filme?
Quem respondeu melhor essa questão foi o cineasta Rafael Gomes, ele mesmo diretor e roteirista – junto com Esmir Filho – de uma das melhores séries de TV produzidas no Brasil para adolescentes: Tudo o que é sólido pode derreter.
Rafael escreveu em seu blogue pessoal:
Ensaiei ressentir-me da velocidade dos acontecimentos, do ar de painel que advém de uma multiplicidade de pequenos dramas, da duração rápida das cenas. Mas o outro jeito de olhar para isso é achar que a vontade de que as cenas perdurem são reflexo da qualidade humana que elas engendram. A travessia dos lugares comuns é a consciência de que, meu deus!, como a adolescência é, mesmo, cheia de lugares comuns – só os clichês são verdade.
Como Rafael diz, os arquétipos pulam na tela e aquele aluno que talvez não entendamos muito bem pode estar – muito bem – passando por questões análogas às de Mano e cia.
Tem coisa mais legal do que entendermos o aluno, assim como ele tenta nos entender?
Thiago Camelo
Ciência Hoje On-line
Disponível em:
http://cienciahoje.uol.com.br/alo-professor/intervalo/cliche-carinhoso-2
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